terça-feira, 11 de julho de 2017

Perfil do Militar/Policial de Elite: O Desafio de Detectar Indivíduos com Aptidão para o Desempenho das Atividades de Operações Especiais

Texto elaborado por Rodney Alfredo P. Lisboa

Fotografia 1: Operador das Forças Especiais do Exército norte-americano. (Fonte: Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=sdSNuWOAleE Acesso em: 10 jul. 2017).

Recentemente, quando trocava mensagens com operadores de um grupo de WhatsApp do qual faço parte, surgiu uma questão que demandou bastante tempo de conversa sem que chegássemos a um parecer conclusivo. Na ocasião dessa confabulação, o assunto central versava sobre o perfil do Elemento de Operações Especiais (ElmOpEsp), e a pergunta que norteava nossa discussão indagava: Qual o perfil do profissional que opera em unidades militares e/ou policiais de elite? Embora não tenhamos conseguido estabelecer uma opinião consensual acerca do tema, uma preocupação comum aos debatedores daquele grupo referia-se, especificamente, à efetividade dos processos de seleção de ElmOpEsp no que concerne à capacidade de identificar os indivíduos que, de fato, reúnem o conjunto de atributos necessários para desempenhar atividades militares/policiais de natureza não convencional. Como pesquisador que se dedica investigar o universo que permeia as Operações Especiais (OpEsp), a falta de elementos que permitiam elucidar essa questão gerou certa frustração, fato que fez com que me debruçasse sobre o assunto na tentativa de encontrar respostas que possibilitem uma melhor compreensão sobre essa problemática. 
A princípio é fundamentalmente importante esclarecer sobre as particularidades que distinguem as OpEsp das operações militares/policiais convencionais. Consideradas de forma bastante genérica, são consideradas OpEsp as ações conduzidas por forças militares/policiais especialmente organizadas, adestradas e equipadas, com a finalidade de alcançar objetivos específicos valendo-se de métodos que fogem ao padrão regular empregado por tropas convencionais. Consideradas em âmbito militar, as OpEsp constituem ações não ortodoxas, realizadas por tropas com elevado nível de aprestamento, realizadas em tempo de paz, de conflito e/ou crise, de forma aberta, sigilosa ou coberta, buscando a consecução de objetivos políticos, econômicos, psicossociais ou militares relevantes. Por sua vez, na esfera policial, as OpEsp tratam de ações que extrapolam o padrão operacional rotineiro, valendo-se de pessoal e material (armas e equipamento) diferenciados, conduzidas em ambientes diversos (rural e/ou urbano), buscando a solução de ocorrências críticas de forma técnica, ética e legal.


Fotografia 2: Alunos do Curso de Operações Especiais ICOESP) ministrado pelo COE (Comandos e Operações Especiais) da Polícia Militar do Paraná (PMPR). (Fonte: Acervo do COE da  PMPR).

Conforme é possível observar, guardadas as diferenças existentes entre ambas atividades, tanto no contexto militar quanto no policial, as OpEsp estão diretamente relacionadas à solução de situações de risco elevado. Assim sendo, mostram-se aptos para o desempenho de tarefas dessa ordem indivíduos que, somando ao domínio da técnica, reúnem o conjunto de atributos humanos (físicos, psicológicos, intelectuais e morais) que os capacitam a lidar de forma eficiente com eventos cuja criticidade os coloca sistematicamente à prova.
No Brasil as particularidades culturais de uma sociedade pouco familiarizada com as questões de Defesa e Segurança, precariamente identificada com as Forças Singulares (Exército, Marinha e Força Aérea) e Auxiliares (Polícias Federal, Rodoviária Federal, Militar e Civil), representam um entrave significativo para atrair a categoria ideal de pessoas dotadas com o rol de predicados necessários para compor as Forças de Operações Especiais (FOpEsp). Em um cenário marcado pelo desinteresse e pela desinformação, voluntariam-se para os programas de seleção e treinamento das unidades militares e policiais de elite pessoas com perfis diversos: homens fascinados pelo estereótipo do “super-soldado” explorado pela indústria do cinema, da TV e/ou do vídeo game, indivíduos viciados nas elevadas cargas de adrenalina (hormônio secretado pelo organismo que funciona como um estimulante natural) que caracterizam atividades potencialmente arriscadas, sujeitos interessados apenas em ostentar um brevê para se vangloriarem do mérito de terem cumprido com os requisitos de um rigoroso programa de formação OpEsp. Assim sendo, pessoas conscientes de suas reais capacidades em relação às demandas dos respectivos programas, além de bem informadas acerca das exigências que lhe serão requeridas pelas atividades OpEsp, candidatam-se aos processos seletivos como uma exceção à regra.
Em uma país que não prima pela valorização de suas FOpEsp, mesmo no seio da comunidade castrense, não é de surpreender que os processos seletivos dos cursos de formação de operadores, sobretudo no que se refere às Forças Auxiliares, deixassem a desejar em alguns aspectos. Um problema recorrente trata da reprodução de modelos de formação que produzem bons resultados em determinado estado, mas que são impróprios ou ineficientes em outras regiões do país em virtude das especificidades que as distinguem. Nesse contexto, seria adequado que os respectivos Órgãos de Segurança Pública tivessem o cuidado de estudar as demandas específicas de cada unidade OpEsp de modo a promover cursos de formação continuada que atendessem aos requisitos da tropa que opera naquela região do Brasil.

Fotografia 3: Candidatos ao programa de seleção e treinamento das Forças Especiais da Croácia. (Fonte: Disponível em: http://specialoperations.com/28007/croatian-sof-selection-and-training/ Acesso em: 10 jul. 2017).

Outro agravante relacionado aos cursos de formação de ElmOpEsp ministrados no Brasil trata da incapacidade de alguns programas em identificar e suprimir previamente pessoas, que a longo prazo, não trazem resultados efetivos para a unidade. Assim, conforme encontram-se estruturados atualmente, alguns processos de seleção aprovam indivíduos que conseguem vencer os rigores físicos e psicológicos do curso, mas que no decorrer da carreira de operador não demonstram ter o comprometimento necessário para com as obrigações da atividade OpEsp. Uma solução viável para essa questão seria criar mecanismos que promovessem o Estudo Profissiográfico e o Mapeamento de Competências dos candidatos antes que o curso de formação seja iniciado.
O Estudo Profissiográfico refere-se ao levantamento prévio dos requisitos básicos necessários para o desempenho de tarefas específicas, bem como à identificação das condições que podem favorecer ou dificultar sua execução. Investigações profissiográficas contribuem para o planejamento estratégico institucional, servindo como referência para processos de recrutamento, seleção, capacitação, avaliação de desempenho, além de colaborarem para a análise da estrutura dos cursos de formação e aperfeiçoamento.
Por sua vez, o Mapeamento de Competências busca identificar, analisar e determinar o conjunto de capacidades profissionais (técnicas e comportamentais) requeridas para o bom desempenho das tarefas inerentes à atividade a ser desempenhada. A partir desse processo é possível perceber eventuais lacunas existentes entre as capacidades apresentadas pelos candidatos e as competências requeridas para a consecução dos objetivos a serem alcançados nos diferentes processos seletivos.

Ilustração 1: Relação (genérica) das capacidades humanas requeridas dos quadros operacionais das unidades militares/policiais de elite. (Fonte: Conteúdo idealizado por Rodney Alfredo P. Lisboa).
Com base no que foi apresentado até o momento, devo externar aqui minha opinião pessoal. Como profissional de Educação Física que atuou por 15 anos em instituições de ensino superior, especificamente em disciplinas relacionadas à Motricidade Humana e à Formação Esportiva, acrescendo os oito anos  em que venho me dedicando à pesquisar o universo relativo às  tropas especiais, acredito que nas OpEsp, assim como em qualquer outra atividade inerente ao ser humano, o talento individual para o desempenho de determinada tarefa encontra-se diretamente relacionado à "predisposição" (característica geneticamente determinada que favorece a aquisição e o desenvolvimento de certas capacidades). Nesse sentido, por mais que a habilidade técnica seja adquirida e aprimorada por ocasião do treinamento sistemático, não existe adestramento, por mais eficiente que seja, capaz de produzir talento em um indivíduo sem tal predicado. Na prática, o operador talentoso possui, intrinsecamente desde a infância, um conjunto de atributos físicos, motores, neurológicos e psicológicos, somados à valores éticos obtidos por influência do meio (social), que favorecem o desempenho optimizado das atividades relacionadas às OpEsp. Uma questão relevante e que merece profunda reflexão refere-se ao fato de que em sendo o talento fruto de herança genética, existem indivíduos com genuína vocação para compor os quadros operacionais das unidades militares/policiais de elite que por falta de instrução e/ou oportunidade acabaram não ingressando em um programa de formação OpEsp, motivo que relegou esse talento à condição de estado latente permanente devido à falta de estímulos que fizessem aflorar capacidades ocultas (não manifestadas). 




10 comentários:

  1. Sinceramente, um dos melhores textos que já li sobre o assunto. Muito interessante pra todos que queiram criar grupos de Operações Especiais.

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    1. Agradeço pelas palavras de incentivo. Estímulos como este nos ajudam a continuar trabalhando em favor das OpEsp mesmo diante dos obstáculos. Forte abraço!!!

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  2. Prezado Professor Rodney;

    A obra Psicologia Militar (Kennedy, Zillmer) da Bibliex aborda, em um de seus capítulos, com muita clareza o processo de seleção de elementos de operações especiais. É uma excelente leitura para os interessados na temática.

    Atenciosamente,

    Carlos

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  3. Concordo plenamente com o texto.Apenas acrescento que, de acordo com minha realidade, a valorização de atributos morais como coragem, honestidade e espírito de corpo têm nos balizado melhor para uma seleção desejável ao preenchimento de nossos quadros operacionais.As características físicas e técnicas são importantes também mas desde que observados esses valores morais nos aluno/candidato a operador.Não adianta termos um baita operador, nos níveis físico e tático se o mesmo promove discórdia no grupo, não tem disciplina consciente em algum grau ou compactua com desvios éticos.
    Mais uma vez parabéns ao Prof Rodney pelo texto, que nos faz refletir como aperfeiçoarmos nossos processos de seleção.Um grande abraço!

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    1. Agradeço as palavras de incentivo Francisco. Fico satisfeito em saber que meu trabalho contribui p/o desenvolvimento dos operadores especiais militares/policiais de nosso país. QUEM OUSA VENCE!!!

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  4. Excelente texto, e no meu ponto de vista, principalmente pelo final (... existem indivíduos com genuína vocação para compor os quadros operacionais das unidades militares/policiais de elite que por falta de instrução e/ou oportunidade acabaram não ingressando em um programa de formação OpEsp, ...). Sempre tive a perspectiva da probabilidade da existência desses indivíduos em tropas convencionais, mas que possuem desempenhos acima da média para suas unidades, mas justamente por isso trazem diferencial a suas unidades, o que acarreta na disseminação, não organizada, porém intrinseca por suas atitutes, da mentalidade de operações especiais a unidaddes convencionais. Ler seu texto e ver que meus raciocínios a respeito do assunto não é tão empírico me deixa feliz nas minhas concepções e me dar mais vontade de continuar pesquisando e lendo a respeito do assunto. De antemão poderia sugerir um texto sobre "a influência da unidade de operações especiais sobre unidades convencionais".Forte abraço.

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    1. Agradeço as observações e fico satisfeito que meu texto coincida com suas opiniões. Sugestão anotada!Forte abraço!!!

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