Adaptação de
artigo publicado por Rodney Alfredo Pinto Lisboa na Revista Marítima
Brasileira, v. 135, n. 01/03, jan./mar. 2015, p. 154-166.
Embora
figure como pioneira na condução de OpEsp abaixo do nível das ondas, a Regia Marina (denominação utilizada pela
Marinha Italiana durante o chamado Reino da Itália [1861-1946]), que no
crepúsculo da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) perpetrou um ataque contra o
encouraçado SMS Viribus Unitis e a Fragata SMS Wien, navios da frota
austro-húngara atracados no porto de Pula (Croácia), destaca-se,
principalmente, pela série de ações inovadoras e sistemáticas levadas à efeito
pela Xª MAS (Xª Flotilha de Meios de Assalto) no curso da Segunda Guerra Mundial
(1939-1945).
A
iniciativa de investir contra embarcações atracadas em portos ocupados por
forças Aliadas no Mar Mediterrâneo surgiu por ocasião do resultado obtido na ação
isolada executada ainda na Primeira Guerra, quando dois mergulhadores,
“montados” em um veículo subaquático rudimentar (Mignatta), penetraram as defesas do porto croata em imersão para
afundar os dois navios de guerra. Ciente de sua inferioridade em relação aos
Aliados no cenário de operações Mediterrâneo, desde 1940 a esquadra britânica
havia estabelecido bases navais nas extremidades Ocidental (Gibraltar) e Oriental
(Alexandria) passando a controlar as rotas de comunicação entre a Europa e a
África, a Regia Marina optou por
adotar a estratégia de “guerra assimétrica” (ação realizada por um ator
inferiorizado em relação ao poder de combate de seu adversário) para tentar
recuperar o livre acesso de suas embarcações na região. Norteados por essa
estratégia, os engenheiros navais italianos, que desde 1935 realizavam um
minucioso estudo do rústico projeto do torpedo tripulado utilizado na Grande
Guerra, desenvolveram o SLC (Torpedo de Baixa Velocidade), apelidado com o
sugestivo nome de Maiale (Porco)
devido ao desconforto e insegurança que o caracterizavam. Este veículo, dotado
com capacidade para transportar dois MECs (Mergulhadores de Combate) montados
sobre sua estrutura, transportava à proa (extremidade anterior) uma ogiva destacável
de 300kg de TNT, que deveria ser fixada sob o casco dos navios inimigos visando
sua detonação após a evasão de seus condutores.
A
concepção de emprego do SLC demandava o transporte do veículo (acondicionado em
compartimentos estanques) e sua tripulação por um submarino anfitrião até as
proximidades da AO (Área de Operação), onde eram lançados, protegidos pela
escuridão da noite, para procederem com a aproximação final. Valendo-se desse
artifício, os torpedos tripulados italianos vitimaram três navios de bandeira
britânica no porto de Gibraltar (os petroleiros Denbydale e Fiona Shell, além
do cargueiro Durham), despertando a atenção das autoridades britânicas no
Mediterrâneo, e levando-as a intensificar os sistemas defensivos portuários
contra ameaças desse tipo, fato que tornou a operações de ataque posteriores
uma tarefa ainda mais arriscada.
O
tipo de missão a que se propunham as tripulações dos Maiale, conhecidos pelo
termo Aurigas (Cocheiros), era
extremamente arriscado não apenas pelos riscos implícitos no contexto da
guerra, mas, sobretudo, em virtude das capacidades precárias de seu equipamento,
uma vez que tanto o SLC quanto o dispositivo de respiração subaquática que
utilizavam se mostravam pouco confiáveis.
No
decorrer da Segunda Guerra Mundial, os SLC e suas respectivas tripulações foram
responsáveis por conduzir doze missões nas quais sabotaram, afundando ou
avariando com seriedade, um total de vinte e cinco embarcações, entre navios de
guerra e navios mercantes, computando 130.000t de material perdido pelas tropas
Aliadas.
Imagem 1: Distintivo da Xª MAS. (Disponível em: http://warfarehistorian.blogspot.com.br/2014/03/odd-fighting-units-italian-frogmen-and.html Acesso em: 7 jul. 2016). |
O
resultado das ações desencadeadas pelos quadros operacionais da Xª MAS influenciaram
a Real Marinha britânica a adotar, ao longo do conflito, métodos similares
àqueles empreendidos pelos MECs italianos, opção que deu origem aos Chariots, versão britânica dos Maiale.
A
tática inovadora e eficiente dos italianos evidenciou a relevância das ações de
sabotagem em imersão, despertando a atenção das Forças Navais ao redor do mundo
para a necessidade de assimilar e dominar essa expertise. Atualmente, mesmo diante da possibilidade de executar
diferentes métodos de infiltração/exfiltração, para as FOpEsp vocacionadas a
operar como MECs, o legado deixado pelos Aurigas
italianos na Segunda Guerra permanece como uma referência imprescindível e os
pormenores doutrinários e tecnológicos inerentes a ele um segredo
intransferível.
Referência:
Grande Mestre Rodney, parabéns pela matéria.
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